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A VIDA DE CHICO PICADINHO

Por Isabella Scala


Francisco da Costa Rocha não teve uma infância fácil. Mesmo antes de nascer, já era indesejado por seus parentes. FIlho de um poderoso exportador de café e de sua amante, que já havia abortado duas vezes anteriormente, foi rejeitado pelo pai quando nasceu.


Quando tinha quatro anos, o sentimento de abandono começou a florescer quando teve que ser levado para ficar aos cuidados de dois empregados de seu pai, por conta dos problemas pulmonares sofridos pela sua mãe, dona Nancy. O casal que ficou encarregado de cuidar de Chico e prover não só necessidades físicas mas também amorosas, não foi suficiente para suprir as necessidades do menino.


Durante o período em que esteve em custódia desse casal, e cada vez mais solitário, Chico encontrou abrigo na mata, com porcos, cachorros, gatos e galinhas. Chico sofria de pesadelos recorrentes e acreditava na teoria que gatos tinham sete vidas, e para comprovar sua teoria, começou a matar os gatos de diferentes maneiras.


Depois de dois anos longe dos pais, dona Nancy voltou para buscar seu filho. Chico estava quase irreconhecível, e sua mãe o levou de volta para morar com ela. A partir desse momento, o garoto começou a presenciar os relacionamentos instáveis e abusivos que sua mãe vivia.


Francisco abandonou os estudos na quarta série. Existem relatos que enquanto estudava numa escola católica, ele tenha presenciado um ato de pedofilia contra um colega seu, algo que contribuiu para deixar seu comportamento cada vez mais isolado e desafetado.


Durante sua adolescência, Chico chegou a participar de um grupo chamado senta pua, e foi lá que começou a sofrer abusos sexuais.


Quando mais velho, Chico começou a trabalhar como corretor de imóveis. Com o novo fluxo de dinheiro e o horário de trabalho flexível, Francisco começou a frequentar a “boca do lixo”, a zona paulista conhecida pelas forte presença de drogas e prostituição.

Durante essa época, Chico começou a manter relações casuais com homens e mulheres. Para isso, utilizava o apartamento que dividia com o seu amigo Caio na Rua Aurora, no centro de São Paulo.


Era agosto de 1966 quando a bailarina austríaca Margareth Suida cruzou caminho com Francisco. Após uma noite de bebedeira, Chico convidou a pretendente para continuar a festa em sua casa. A análise da perícia policial determinou que o crime demorou a acontecer, pois diversas bitucas de cigarro com marcas de ambas as partes do casal foram encontradas pelo apartamento.


Durante o ato sexual, Chico ceifou a vida da amante a enforcando com um cinto. Ele manteve o corpo de Margareth na banheira do apartamento. Depois de colocar o corpo da mulher lá, ele começou a cortá-lo. Cortou seus mamilos com uma gilete, e retaliou seus seios, pélvis, músculos e nádegas. A perícia constatou que ela foi atingida nas regiões dorsal direita, glútea direita, perianal, parte anterior do pescoço, torácica, abdominal, pubiana, coxa esquerda, braço e antebraço esquerdo.


No dia seguinte, contou ao seu amigo e colega de apartamento o que havia feito. Chico pediu que Caio não o entregasse, mas não demorou para a polícia o prender.


Os autos do processo contam que a motivação de Chico para o crime foi a semelhança de Margareth com dona Nancy, visto que as duas se relacionavam sexualmente com homens em troca de bens ou status social. Porém, há quem diga que a motivação foi a ridicularização de Margareth quando Chico propôs sexo anal.


Francisco foi condenado a 18 anos de reclusão por homicídio qualificado, somados a mais 2 anos e 6 meses pela destruição do cadáver. Durante o período em que esteve preso, Chico se casou. E, oito anos após o crime, teve sua liberdade.


O casamento não deu certo, mas sua esposa engravidou a demandou que Chico não agisse igual seu próprio pai e fosse presente na vida do filho. Ele se casou novamente e teve outro filho, que sofria de problemas psiquiátricos.


Mais uma vez solteiro, veio achar consolo num local familiar: a “boca do lixo”. Sua sexualidade se tornou cada vez mais sádica e práticas agressivas durante o ato social se tornaram cada vez mais comuns.


Quase dois anos e meio em liberdade, Chico voltou a matar. A vítima dessa vez foi Ângela, uma prostituta. Durante a prática sexual, Chico a matou da mesma maneira que matou Margareth.


Desesperado, Francisco procurou uma maneira de ocultar o corpo de Ângela. Decidiu que o jeito certo de fazer isso seria suas vísceras no vaso sanitário, que não demorou a entupir. Retirou os seus olhos e tentou diminuir o tamanho de seu crânio para facilitar o despejo do cadáver.


Tentando buscar uma maneira de fugir, Chico tentou entrar em contato com um velho companheiro de cela que achou que poderia ajudá-lo. Mas a ação policial foi mais rápida e capturou o assassino.


Durante seu julgamento, a Defesa alegou insanidade e Chico foi considerado semi-imputável por ser considerado portador de personalidade psicopática do tipo complexo. Mesmo com todos argumentos que a Defesa trouxe, o Conselho de Segurança condenou Chico a 22 anos e 6 meses de exclusão.


Em 1994, Francisco da Costa Rocha foi submetido a um exame psiquiátrico detalhado, que culminou na instauração de incidente da sua sanidade mental e na remoção do assassino para a Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté, para receber o tratamento médico necessário. O Ministério Público, por sua vez, pediu a decretação de interdição em estabelecimento psiquiátrico de regime fechado.


A Classificação Internacional de Doenças (CID – 10), define o Transtorno de Personalidade Antissocial, que costumava ser chamado de personalidade psicopática, como: “Transtorno de personalidade caracterizado por um desprezo das obrigações sociais, falta de empatia para com os outros. Há um desvio considerável entre o comportamento e as normas sociais estabelecidas. O comportamento não é facilmente modificado pelas experiências adversas, inclusive pelas punições. Existe uma baixa tolerância à frustração e um baixo limiar de descarga da agressividade, inclusive da violência. Existe uma tendência a culpar os outros ou a fornecer racionalizações plausíveis para explicar um comportamento que leva o sujeito a entrar em conflito com a sociedade”. Ilana Cassoy, criminóloga e escritora brasileira, aponta características comuns na formação e no passado de diversos assassinos em série, como relações familiares difíceis ou mesmo inexistentes, sadismo manifestado desde a infância, todas características presentes durante a formação de Chico. Por mais que Chico tenha tido um começo de vida difícil e uma formação debilitada, não podemos nos enganar: ele é um psicopata diagnosticado que, dada a oportunidade e os meios, poderia voltar à ativa. No momento, o assassino sádico, que recebeu seu apelido por esquartejar suas vítimas para facilitar o processo de ocultação do cadáver, encontra-se internado em um estabelecimento psiquiátrico, por decisão juíza Sueli Zeraik de Oliveira Armani, da 1ª Vara de Execuções Criminais de Taubaté, observando que ele já ultrapassou o limite definido pelo artigo 75 do Código Penal, o que “fere o preceito constitucional proibitivo da prisão perpétua”.



Caso tenha interesse, vale a pena conferir os relatos de Percival de Souza, jornalista investigativo consagrado, que conviveu e entrevistou Chico Picadinho em várias ocasiões: https://noticias.r7.com/prisma/arquivo-vivo/como-ouvi-as-confissoes-de-chico-picadinho-o-matador-de-mulheres-02012018

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