Por Camille Santos
Heloísa Borba Gonçalves ou Heloísa Gonçalves Duque Soares Ribeiro ou ainda Heloísa Saad, com 61 anos se tornou protagonista de uma intrincada trajetória onde há mortes, estelionatos, poligamia e dinheiro.
Ficou conhecida como “Viúva Negra” pelos vários crimes de que é acusada: quatro homicídios e duas tentativas de homicídio, sendo alguns contra seus ex-maridos.
Já foi condenada a 4 anos e 6 meses de prisão pela 19ª Vara Criminal do Rio, pelos crimes de bigamia e falsidade ideológica, onde também foi expedido um mandado de prisão em desfavor da procurada, além de ter sido denunciada por fraudar o INSS. Em uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que lhe negou um pedido de habeas corpus no ano 2010, Heloísa foi chamada pela ministra Carmem Lúcia, de “criminosa contumaz e perigosa”.
No documento, a magistrada resume seu histórico de crimes já registrados na Justiça: ela foi denunciada pela morte de Jorge Ribeiro, um dos maridos; é a principal suspeita da morte tanto do ex-namorado Wargih Murad, que descobriu seu passado suspeito, e do pedreiro que o acompanhava na ocasião; é acusada ainda de tentar matar o filho de Wargih, Eli Murad, que na ocasião levou dois tiros na nuca, e de mandar matar o detetive por ele contratado para investigar a morte do pai, Luiz Marques da Mota.
Segundo a polícia, o tenente-coronel foi torturado e atingido por diversos golpes na cabeça enquanto estava imobilizado com as mãos amarradas para trás, no dia 19 de fevereiro de 1992. O motivo seria sua herança. O julgamento está marcado para o dia 25 julho.
O militar foi encontrado na sala comercial que mantinha em Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro, deitado no chão com a barriga para baixo, a boca amordaçada e o rosto envolto por uma corda de nylon. As diversas marteladas lhe provocaram traumatismo craniano.
Com base na denúncia do MP, a “Viúva Negra” - apelido que recebeu dos investigadores em alusão a um tipo de aranha que mata o macho após a cópula - teria contratado uma terceira pessoa, ainda não identificada, para matar o marido.
A promotora Patrícia Glioche sustenta que ela não só teria planejado o crime como também auxiliado e facilitado a fuga do assassino.
De acordo com o STF, Heloísa teve um marido, Irineu Duque Soares, assassinado em 1983, em Magé, meses depois de ter se casado com ela, com pacto nupcial de comunhão total de bens. Na época, após seu depoimento à delegacia, o crime foi registrado como latrocínio, roubo seguido de morte.
O documento afirma ainda que um de seus companheiros e pai de alguns de seus filhos, Carlos Pinto da Silva, chegou a ser denunciado por crimes patrimoniais junto com Heloísa e acabou sofrendo uma tentativa de homicídio durante uma viagem com ela à Salvador. Na época, ele chegou a acusá-la de ser a responsável pelos tiros que o atingiram. Essas são apenas algumas das informações sobre a acusação de que se tem notícia, resumiu a magistrada.
Heloísa ainda responde por falsidade ideológica, devido nove acusações, e poligamia. Na época do crime, estaria casada com três homens: o tenente-coronel Jorge Ribeiro, o comerciante Nicolau Saad, e o policial militar Roberto de Souza Lopes. De acordo com o MP, a “Viúva Negra” aproveitava a falta de comunicação entre cartórios para selar os matrimônios. Também usava diversas identidades para burlar a lei.
O casamento com o PM teria sido realizado em 1985, num cartório em Copacabana. Pouco tempo depois, segundo mostram as investigações, ela teria conhecido Nicolau, de quem se tornou advogada, e, posteriormente, Jorge, a quem teria sido apresentada por uma amiga.
Documentos anexados ao processo mostram que o casamento com Jorge teria sido realizado em junho de 1989, na cobertura em que ele morava na Rua Rainha Guilhermina, no Leblon (zona sul), por um oficial de registro civil de um cartório na Freguesia, em Jacarepaguá (zona oeste).
Ela teria apresentado documento de identidade como Heloísa Gonçalves Duque Soares, sobrenome que recebeu após casar-se com seu primeiro marido, em 1983, Irineu Duque Soares. Ele morreu assassinado cinco meses depois do casamento, num caso que a polícia considerou latrocínio.
Quando era casada com o militar Jorge Ribeiro, casou-se, ao mesmo tempo, com o comerciante aposentado Nicolau Saad, que morreu pouco tempo depois. Com idade avançada, sua morte foi tida na época como natural. Ela passou, então, a usar uma antiga procuração do marido para transferir imóveis do falecido e acabou condenada por falsidade ideológica.
Além das provas apuradas no inquérito policial que investigou o assassinato do militar, a acusação tentou mostrar aos jurados que Heloísa obteve vantagem em todos os seus relacionamentos amorosos. Casou-se quatro vezes e namorou outros três homens. Cinco morreram. Segundo o MP, com seis deles teria tido filhos e herdado bens.
O juiz Fábio Uchôa, titular do 1º Tribunal do Júri, já deixou claro, em decisões anexadas ao processo, que aceita a tese do MP, que alega que a Reforma Processual permite que julgamentos sejam feitos à revelia, ou seja, sem a presença do réu. A defesa de Heloísa levou a discussão para o Superior Tribunal de Justiça, que ainda não se manifestou.
Os detetives também descobriram que depois da morte de seu último namorado, em 1993, ela se casou mais uma vez, no Brasil, com o empresário peruano Vicente Lopez Haman. A união foi registrada no dia 12 de julho de 2002, no 24º Ofício de notas, na Barra da Tijuca.
“Não acreditamos que tenha sido um casamento de verdade. Até onde sabemos, Haman possui green card (visto de permanência) e ela se uniu a ele para ter direito ao documento e viver livremente nos EUA”, diz Ramalho.
A promotora Patrícia Glioche chama a atenção para o comportamento da "Viúva Negra". “É uma sedutora. Anda muito bem vestida, se apresenta como juíza federal e ninguém desconfia. Atitudes, que, aliás, são típicas de todo estelionatário”, diz Glioche.
“Para se ter uma ideia da cara de pau que ela tem, certa vez eu caminhava em um shopping na Barra da Tijuca e ela veio falar comigo. Muito simpática e sorridente. Só depois que ela se despediu que eu atentei para quem era”, relembra a promotora, que na época não poderia ter determinado a prisão de Heloísa porque ela respondia em liberdade.
Após faltar a quatro julgamentos, Heloísa foi condenada em 26/08/2011, a 18 anos de prisão, além dos 4 anos e 6 meses que já havia sido condenada, pelo 2º Tribunal do Júri do Rio, num julgamento que durou oito horas. A condenação ocorreu graças à Lei da Cadeira Vazia, de 2008, que permite em casos de seguidas faltas do réu.
Além disso, Heloísa encontra-se na lista de procurados da Interpol Polícia Internacional, sendo procurada em cento e oitenta e oito países.
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