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THE STAIRCASE: O MANÍACO DA ESCADA

Por Camille Santos


Em junho de 2018 a Netflix adicionou em seu catálogo a minissérie “The Staircase” um documentário cru que não possui narrador e é composto de compilações de cenas gravadas a partir do dia em que Michael Peterson foi acusado do crime.


Mas do que Michael Peterson estava sendo acusado que o levou a contratar cinegrafistas que o ajudassem, através das gravações do documentário, mudar a opinião pública com relação ao incidente e provar sua inocência?


Na madrugada de 9 de dezembro de 2001, Michael Peterson ligou para o 911 em pânico. "Minha esposa sofreu um acidente. Ela caiu da escada", disse ele.


Peterson contava freneticamente ao policial como sua esposa, Kathleen — deitada numa poça de sangue ao pé de uma escada nos fundos da mansão do casal em Durham, Carolina do Norte —, estava respirando, mas inconsciente. “Por favor”, implorava, “Mande alguém aqui imediatamente”.


Em 20 de dezembro de 2001, Michael Peterson foi acusado de assassinar a mulher. O gabinete do promotor público argumentaria que os ferimentos de Kathleen Peterson, que incluíam várias lacerações na cabeça, eram inconsistentes com a queda da escada. Para os promotores, o marido havia espancado a mulher até a morte.


Em outubro de 2003, após um julgamento de três meses, um júri condenou Peterson a prisão perpétua, por homicídio em primeiro grau. Mas isso foi apenas o começo de uma confusa e muitas vezes inacreditável saga jurídica.


Esse caso acabou gerando opiniões controversas em relação a inocência de Michael. E com isso algumas teorias foram levantadas pela defesa, acusação e família.


De acordo com a defesa, Peterson teria passado uma ótima noite com sua esposa. Eles teriam assistido a "Os queridinhos da América", alugado na Blockbuster. Estavam bebendo para comemorar a compra de um de seus romances para ser adaptado para o cinema. Passaram a noite conversando, como costumavam fazer, e acabaram saindo para descansar à beira da piscina.


De acordo com Peterson, Kathleen fez uma conferência telefônica e entrou na casa bem antes dele. Mais tarde, ele a encontrou ao pé da escada. Sua equipe jurídica, liderada pelo advogado de defesa David Rudolf, alegou que ela tinha misturado Valium com álcool e teria caído depois de "tentar subir de chinelos uma escada estreita e mal iluminada".


Já a acusação pintou um quadro muito diferente. Os promotores argumentaram que Peterson espancou brutalmente sua esposa com um atiçador de lareira e que as feridas na cabeça foram causadas por traumas de força contundente. Eles alegaram que Peterson tinha dívidas e consideraram uma apólice de seguro de vida de US$ 1,4 milhão como o motivo do crime.


Já a família se encontrava dividida.

Os Peterson, que haviam sido casados antes, tinham cinco filhos entre eles. Michael tinha dois filhos biológicos, Todd e Clayton, e duas filhas enteadas, Margaret e Martha Ratliff. Kathleen teve uma filha, Caitlin Atwater. Os filhos de Michael o apoiaram durante todo o julgamento.


Caitlin inicialmente apoiou Michael, mesmo servindo como porta-voz da família depois que ele foi acusado. Mas ao final do julgamento, ela havia rompido publicamente com o padrasto. "Após as discussões finais, quando tudo foi dito e feito, eu sabia o que tinha acontecido. Eu sabia o que tinha acontecido com a minha mãe", disse em uma entrevista em 2017.


Outra figura que manteve uma crença inabalável na inocência de Michael foi sua primeira mulher Patty Peterson, com quem teve os filhos Todd e Clayton. Patty e Michael eram casados na época da morte de Elizabeth Ratliff. Ela e Patty trabalhavam no mesmo colégio e se tornaram melhores amigas, o que se manteve até a morte de Elizabeth.


Algumas pessoas passaram a acreditar na inocência de Michael após o apoio demonstrado por Patty, principalmente pelo fato de ela ainda estar viva.

Discrepâncias sobre o passado de Michael e detalhes sobre sua vida pessoal surgiram durante o julgamento. "Pelo que descobrimos, cada aspecto da vida de Mike Peterson é uma mentira", disse Jim Hardin, promotor público.


A promotoria se concentrou em fotos e e-mails encontrados no computador de Peterson sugerindo vários casos extraconjugais com homens. Segundo a acusação, na noite do crime, Kathleen havia descoberto tudo. Michael garante que ela sabia sobre sua bissexualidade e estava ciente de que ele tinha feito sexo com outras pessoas.


Enquanto os promotores se preparavam para o julgamento, descobriu-se que a mãe das filhas adotivas de Peterson, Elizabeth Ratliff, também fora encontrada morta ao pé de uma escada, cerca de duas décadas antes. Ratliff morou perto de Peterson e de sua primeira esposa, Patty, em uma base militar na Alemanha. Na época, sua morte foi considerada o resultado de uma hemorragia cerebral. Mas, dadas as semelhanças, os promotores pediram que seu corpo fosse exumado e examinado por um médico legista da Carolina do Norte. A conclusão: a morte de Ratliff foi resultado de um homicídio.


Diante de tanta controvérsia, o caso acabou sendo decidido pela prova técnica. Peritos da acusação, incluindo a médica legista, foram categóricos em afirmar que as lacerações de Kathleen eram incompatíveis com uma hipotética queda, enquanto a defesa acreditava ter comprovado que era possível que os machucados revelados na autópsia adviessem de um tombo.


Finalmente, em outubro de 2003, após três meses de julgamento o júri deu seu veredito: condenando Michael Peterson a prisão perpétua.


Durante anos, Michael Peterson e os seus apoiadores lutaram contra a condenação. Em 2009 uma teoria elaborada por um vizinho de Michael e advogado, Larry Pollard. Durante as investigações da equipe de defesa, foi descoberto que Kathleen estava segurando tufos de seu próprio cabelo no momento da sua morte. Com o cabelo, foram encontrados segmentos microscópicos de penas e lascas de madeira.


Pollard então desenvolveu a teoria inicialmente inacreditável de que Kathleen teria sido atacada por uma coruja-barrada em uma das varandas na parte de fora da casa, o que explicaria as sete lacerações em seu crânio e machucados em sua face, e o fato de ter sido encontrado porções menores de sangue do lado de fora. Desorientada, Kathleen cambaleou para dentro da propriedade, até cair das escadas.


O que parecia inconcebível começou a ganhar mais credibilidade após especialistas em corujas e veterinários corroborarem a teoria. O expert Alan van Norman disse que as lacerações no crânio de Kathleen e a distância entre elas são consistentes com ferimentos feitos pelo bico da coruja-barrada. Já o veterinário Patrick T. Redig afirma que os ferimentos de Kathleen são perfeitamente consistentes com o repertório comportamental de corujas maiores.


Após anos de apelações, Michael Peterson recebeu um novo julgamento e foi libertado em 2011, quando um juiz concluiu que uma testemunha de acusação havia mentido. A condenação foi anulada e uma nova data de julgamento marcada para maio de 2017.

Mas, em fevereiro de 2017, Peterson tornou-se oficialmente um homem livre após entrar com um Alford plea, um tipo de apelação judicial prevista na lei americana na qual o réu admite que a acusação tem provas contra ele que provavelmente levariam a uma condenação, mas ainda assim não admite o ato criminoso, mantendo a alegação de inocência.


Sendo assim, sob os termos do pedido, como explica o "Raleigh News & Observer", Peterson, "reconheceu que os promotores tinham provas suficientes para condená-lo por homicídio voluntário". Ele não era obrigado a passar mais tempo na prisão, pois foram considerados os oito anos que já havia servido atrás das grades.


Ambas as irmãs de Kathleen Peterson criticaram a decisão após o acordo judicial. “A expressão ‘Alford plea’ não faz sentido. Não significa nada. Culpado”, disse Candace Zamperini. “Você tirou brutalmente a vida de uma mulher que te sustentava, cuidava dos seus filhos, amava seus filhos. Ela te amava.”


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